Relacionamento. Ser infiel, certo ou errado?

Por: Rebeca Oliveira

Um tema constante em todo o debate sexual é uma pergunta que está sempre presente: afinal, por que os homens e as mulheres traem? É lógico que nem todos confirmam que têm suas aventuras, porque apenas um raríssimo número de indivíduos justifica a prática com o simples argumento de que o homem é um caçador. Em qualquer pesquisa nesse sentido, as respostas se repetem: a grande maioria admite ser possível praticar uma relação extraconjugal. Diante de tudo isso, o que se constata é que falta amor para boa parte dos homens e das mulheres que assume a iniciativa da infidelidade.



Nesta entrevista, a sexóloga Regina Navarro Lins analisa um fenômeno dos dias de hoje, quando o amor começa e quando o sexo afasta, tanto para a mulher como para o homem. Segundo ela, mesmo que ambos se gostem, a rotina, a excessiva intimidade e a falta de mistério neutralizam qualquer emoção. Além disso, para a sexóloga, prevalece muito mais a segurança nas relações do que o prazer, uma vez que os casais fazem preponderar mais a fidelidade do que o desejo. Psicanalista, Regina Navarro Lins foi professora de Psicologia da PUC-Rio e conta com uma agenda cheia para palestras e workshops que versem a respeito do amor, do casamento e do sexo. Ela também é autora de 10 livros, entre eles o best-seller “A Cama na Varanda”.

Regina Navarro não concorda que se considere uma relação extraconjugal como traição. Ela é muito objetiva e segura quando afirma não haver problema algum se o casal faz pouco sexo, mas desde que os dois estejam satisfeitos com isso, ressalvando que não é o que ocorre na maior parte das vezes. “Geralmente, se um não quer fazer sexo, o outro sofre. No casamento, se a mulher não quer fazer sexo, o homem fica com a autoestima abalada, sente-se desvalorizado, fica inseguro...”.

Ela acredita que, em uma relação estável, as pessoas têm de estar juntas pelo prazer da companhia que uma transmite à outra. Por fim, ela salienta que ninguém tem nada a ver com o que o outro faz, até porque cada um tem que ter o seu espaço, a sua individualidade.

Leiam a entrevista e tirem as suas dúvidas.



- Quais fatores levam um dos parceiros, em uma relação amorosa - em todas as suas variações -, a procurar uma estabilidade extraconjugal?
- No livro “A Cama na Rede”, 72% das pessoas disseram que já foram infiéis e explicaram suas razões. Embora todos os ensinamentos que recebemos desde que nascemos - na família, na escola, nos conselhos dos amigos, na religião - nos estimulem a investir nossa energia sexual em uma única pessoa, a prática é bem diferente. Uma porcentagem significativa de homens e mulheres casados compartilha seu tempo e seu prazer com outros parceiros. Penso que está mais do que na hora de se refletir sobre a questão da exclusividade. Pesquisando o que estudiosos do tema pensam sobre as motivações que acarretam uma relação extraconjugal na nossa cultura, fiquei bastante surpresa.
- O que mais lhe surpreendeu?
- As mais diversas justificativas apontam sempre para problemas emocionais, insatisfação ou infelicidade na vida a dois. Não li em quase nenhum lugar o que me parece mais óbvio: embora haja insatisfação na maioria dos casamentos, as relações extraconjugais ocorrem principalmente porque as pessoas gostam de variar. Um casamento pode ser plenamente satisfatório do ponto de vista afetivo e sexual e mesmo assim as pessoas podem ter relações extraconjugais. Vivemos um período de grandes transformações no mundo. Assim, no que diz respeito ao amor, o dilema atual se situa entre o desejo de simbiose com o parceiro e o desejo de liberdade.



- Sua pesquisa virtual para o livro “A Cama na Rede” revela uma sociedade ainda conservadora ou disposta a reaprender novas formas de amor?



- Estamos no meio de um processo de profunda mudança das mentalidades, que se iniciou nas décadas de 1960/1970, com o advento da pílula anticoncepcional e de todos os movimentos de contracultura do período. As mudanças são graduais. Em 2000, quando o site entrou no ar, as pessoas já eram bem mais livres do que nas décadas anteriores. Alguns placares, inclusive, foram surpreendentes - por exemplo, o da pergunta “Você gostaria de fazer sexo a três?” -, que eu imaginei que muitas pessoas responderiam “sim”, mas nunca pensei que o percentual chegasse a 77%. O anonimato facilita dizer o que se deseja e não se tem coragem de revelar aos outros. As pessoas sofrem muito com seus desejos, suas fantasias, seus medos e suas culpas. Ainda há pessoas conservadoras, mas muitos desejam se livrar do moralismo e dos preconceitos para viver de forma mais satisfatória.

- No último mês, uma pesquisa divulgada pela revista Alfa mostrou que 73% dos homens casados já traíram. Surpreendentemente, 81% dos relacionamentos continuaram após a descoberta da traição. Esses dados revelam o início de uma nova mentalidade no campo afetivo?

- Claro. Se uma relação é ótima, por que alguém deve se separar se descobrir que o outro teve uma relação extraconjugal? A grande viagem do ser humano hoje é para dentro de si mesmo. Todos querem saber das suas singularidades, desenvolver seu potencial. Não há mais espaço para sacrifícios só para ter alguém ao lado. Em vez de nos preocuparmos se nosso parceiro ou companheira transou com outra pessoa, deveríamos apenas responder a duas perguntas: “Eu me sinto amado? Eu me sinto desejado?”. Se a resposta for positiva, ótimo. O que o outro faz quando não está comigo não é da minha conta, não me diz respeito.



- Dessa forma, as pessoas viveriam melhor?



- Não tenho dúvida de que assim as pessoas viveriam muito melhor. Falta uma reflexão a respeito do modelo de casamento vivido na nossa cultura. Nega-se o óbvio: o desejo sexual por outras pessoas constitui parte natural da pulsão sexual. Quando essa mentalidade mudar, as torturas psicológicas e os crimes passionais certamente diminuirão, assim como inúmeros outros fatores que geram angústia.

- Ainda assim, 80% dos homens e das mulheres continuam considerando a fidelidade um fator de extrema importância em uma relação, segundo pesquisa do Datafolha no último ano. O que explica esses dados tão controversos?
- Provavelmente, as pessoas dizem isso porque temem que seus parceiros tenham relações extraconjugais. Além disso, porque desejam também manter a idealização do par amoroso. A antropóloga americana Helen Fisher conclui que nossa tendência para as ligações extraconjugais parece ser o triunfo da natureza sobre a cultura. “Dezenas de estudos etnográficos, sem mencionar inúmeras obras de história e de ficção, são testemunhos da prevalência das atividades sexuais extraconjugais entre homens e mulheres do mundo inteiro. Embora os seres humanos flertem, apaixonem-se e se casem, eles também tendem a ser sexualmente infiéis a seus cônjuges”, diz ela.

- Por que a monogamia se tornou um padrão para a nossa sociedade?
- Um dos pressupostos mais universalmente aceitos em nossa sociedade é o de que o casal monogâmico é a única estrutura válida de relacionamento sexual humano, sendo tão superior que não necessita ser questionado. Na verdade, nossa cultura coloca tanta ênfase nisso que uma discussão séria sobre o assunto dos relacionamentos alternativos é muito rara. Entretanto, as sociedades que adotam a monogamia têm dificuldades em comprovar que ela funciona. Ao contrário, parece haver grandes evidências, expressas pelas altas taxas de relações extraconjugais, de que a monogamia não funciona muito bem para os ocidentais.



- Será possível, em alguns anos, haver a convivência pacífica entre casais, mesmo que uma das partes ou ambos admitam ter relações com outras pessoas?



- A mudança das mentalidades é lenta e gradual. E, no que diz respeito ao amor e ao sexo, acredito que seja irreversível.


- Estamos preparados para isso? Há precedentes históricos?
- Quanto à questão de estarmos preparados ou não para uma convivência pacífica, sabendo que o outro vive uma relação amorosa fora do casamento, gostaria de lembrar de algumas décadas atrás. Se nos anos 1950, e mesmo na década de 1960, alguém dissesse que dali a algumas décadas seria comum os casais se separarem, ninguém aceitaria essa ideia. As pessoas diriam que a sociedade não estaria preparada para isso. Naquela época, uma mulher separada não era respeitada e muitas vezes era considerada uma prostituta. Os filhos eram discriminados e sofriam muito. O mesmo acontecia com a virgindade. Imagina o que essas pessoas diriam para outra que afirmasse que, dentro de algum tempo, as moças não casariam virgens! A virgindade era um valor, algo que deveria ser preservado. Hoje, sabemos que esses valores mudaram completamente. É provável que o mesmo aconteça com o “poliamor” [relação sexual ou amorosa entre três ou mais pessoas, que se distingue da poliandria e da poligamia, porque pode ser bissexual ou homossexual].

- Como lidar com o ciúme, que, moderado ou em excesso, parece ser elemento fundamental em uma relação?
- Nas relações monogâmicas, o ciúme é frequente porque aprendemos que quem ama não sente desejos ou não se interessa por mais ninguém. Então, se percebo que meu parceiro se interessou por outra mulher, imagino logo que ele não me ama mais e sofro muito com isso. É um grande equívoco. Os “poliamoristas” dizem que o ciúme não é inato, inevitável e impossível de ser superado.

- Qual é a postura que eles adotam, então?
- Eles aceitam o fato evidente de que todos têm sentimentos em relação a outras pessoas que os rodeiam. Como nenhuma relação está posta em causa pela mera existência de outra, mas sim pela sua própria capacidade de se manter ou não, os adeptos garantem que o ciúme não tem lugar neste tipo de relação. Há um novo termo para o oposto do ciúme: “compersion” [sem tradução para o português ainda, mas que talvez possa ser traduzido como “comprazer”]. “Compersion” é o sentimento de contentamento que advém do conhecimento de que uma pessoa que você ama é amada por mais alguém.



- Qual é a linha tênue que separa o ciúme saudável, natural, do sentimento de posse, aquele que mina uma relação até torná-la insustentável?



- Os que defendem a existência do ciúme na vida a dois fazem ressalvas apenas quanto ao exagero e aos comportamentos agressivos. Mas, independentemente da forma que se apresente, o ciúme é sempre tirano e limitador. Não só para quem ele é dirigido, mas também para quem o sente. O desrespeito que se observa numa cena de ciúme não se limita às agressões físicas ou verbais. Até uma cara emburrada durante um passeio, por exemplo, pode impedir que se viva com prazer.

- É um sentimento aprisionador. Há como se libertar dele?
- Quando a pessoa consegue elaborar bem a dependência infantil e também se libertar da submissão aos valores morais, percebe-se menos ciumenta. Caso contrário, é difícil ter autonomia suficiente. Dessa forma, podem reaparecer as antigas inseguranças, com exigência de exclusividade no amor. Como são poucos os que se sentem autônomos, observa-se uma busca generalizada por vínculos amorosos que permitam aprisionar o parceiro, mesmo à custa da própria limitação.

- Qual é o perfil das pessoas ciumentas?
- O ciumento, geralmente, é quem apresenta duas características fundamentais: baixa autoestima e incapacidade de ficar bem sozinho. Quem é inseguro não se acha possuidor de qualidades, tem uma imagem desvalorizada de si próprio e teme ser trocado por outro a qualquer momento. Para evitar isso, restringe a liberdade do parceiro e tenta controlar suas atitudes. Só quem realmente acredita ser uma pessoa importante não sente ciúme. Sabe que ninguém vai dispensá-lo com tanta facilidade. Além disso, se tiver desenvolvido a capacidade de ficar bem sozinho, sem depender de uma relação amorosa, melhor ainda. Pode até sofrer em caso de separação, mas tem certeza de que a vida continua.

- No best-seller “A Cama na Varanda”, a senhora faz a previsão de que o amor romântico, idealizado, tende a ser substituído por diferentes formas de nós nos relacionarmos. Será o fim das relações estáveis, monogâmicas?
- Vivemos ainda sob o mito do amor romântico. Esse tipo de amor se caracteriza pela idealização do outro e traz a ideia de que você tem de encontrar alguém que lhe complete, sua alma gêmea; traz a ideia de que os dois se transformarão num só, que nada mais vai lhes faltar, que cada um terá todas as suas necessidades satisfeitas pelo outro. Agora, a busca da individualidade caracteriza a época em que vivemos. O amor romântico propõe o oposto disso, na medida em que prega a fusão de duas pessoas. Ele então começa a deixar de ser sedutor.



- Como seria esse novo tipo de amor?



- Um amor baseado na amizade e no companheirismo está surgindo. Haverá menos idealização e você vai poder perceber melhor o outro. O amor romântico está saindo de cena e levando com ele a sua principal característica: a exigência de exclusividade. Sem a ideia de encontrar alguém que lhe complete, abre-se um espaço para outros tipos de relacionamento, com a possibilidade de se amar mais de uma pessoa de cada vez. Acredito que num futuro próximo menos pessoas vão desejar se fechar numa relação a dois e mais gente irá optar por relações múltiplas. Talvez seja possível ter relações estáveis com várias pessoas ao mesmo tempo, escolhendo-as pelas afinidades. Quem sabe uma pessoa para ir ao cinema e ao teatro, outra para se conversar, outra para viajar, uma parceria especial para o sexo, e assim por diante? A ideia de que um parceiro único deva satisfazer todos os aspectos da vida tem grandes chances de se tornar coisa do passado.

- Quando acaba o tesão em um casamento é hora de mudar de parceiro ou ainda vale a pena investir na relação?
- A falta de sexo no casamento nada tem a ver com falta de amor. Muitas mulheres amam seus maridos, só não sentem mais desejo algum por eles. O número de homens que perdem o desejo sexual no casamento é bem menor do que o de mulheres. Para cada homem que não tem vontade de fazer sexo há pelo menos quatro mulheres nessa situação.

- Por que o desejo acaba no casamento?
- Mesmo que os dois se gostem, a rotina, a excessiva intimidade e a falta de mistério acabam com qualquer emoção. Busca-se muito mais segurança do que prazer. Para se sentirem seguras, as pessoas exigem fidelidade, o que sem dúvida é limitador e também responsável pela falta de desejo. A certeza de posse e exclusividade leva a pessoa ao desinteresse, por eliminar a sedução e a conquista. Familiaridade com o parceiro, associada ao hábito, pode provocar a perda do desejo sexual, independentemente do crescimento do amor e de sentimentos como admiração, companheirismo e carinho.

- O que fazer, então?
- É fundamental todos saberem que na grande maioria dos casos não se trata de problema pessoal ou daquela relação específica, e sim de fato inerente a qualquer relação prolongada, quando a exclusividade sexual é exigida. Essa informação pode evitar acusações mútuas, em que se busca um culpado pelo fim do desejo. As soluções são variadas, mas até as pessoas decidirem se separar há muito sofrimento. Alguns fazem sexo sem vontade, só para manter a relação. Outros optam por continuar juntos, vivendo como irmãos, como se o sexo não existisse. E ainda existem aqueles que passam anos se torturando por não aceitar se separar nem viver sem sexo.

- A senhora detectou, em pesquisa virtual, que oito em cada 10 entrevistados não consideram o casamento como o melhor caminho para a vida a dois. Qual será o formato no futuro? A individualidade irá prevalecer?
- Existe um lugar, único no mundo, onde podemos obter a satisfação imediata de todas as nossas necessidades: é o útero da mãe. Aí desconhecemos a fome, a sede e a falta de aconchego. Mas nascemos. Precisamos respirar com nossos próprios pulmões, reclamar da fralda molhada, nos desesperar com a cólica. Somos tomados por um profundo sentimento de falta. Uma angustiante sensação de desamparo nos invade. Sem retorno ao estágio anterior, isso nos acompanhará por toda a vida. A partir daí, todos se tornam parecidos. As singularidades não mais existem. O condicionamento cultural impõe como única forma de atenuar o desamparo uma relação amorosa fixa e estável: o casamento.

- Esse padrão será rompido?
- Embora 80% das pessoas respondam que o casamento não é o melhor caminho para a vida a dois, na prática ainda é difícil romper com esse padrão. Mas refletir sobre isso, como os internautas fizeram, já é o sinal de que uma mudança de comportamento está a caminho. O casamento que conhecemos dá sinais de que será radicalmente modificado. Muitos o consideram um obstáculo à liberdade. Apreciam a descoberta, a aventura, a falta de rotina, o convívio com pessoas diferentes e principalmente não se sentem obrigados a fazer alguma coisa só para agradar ao outro. A insatisfação na vida a dois da grande maioria dos casais impulsionou essas mudanças. Estatísticas mostram que homens e mulheres americanos casados gastam, em média, apenas meia hora por semana conversando. Os modelos tradicionais de comportamento não estão dando mais respostas; com isso, abre-se um espaço para cada um escolher sua forma de viver.

- Antigamente, o curso de uma relação entre indivíduos apaixonados ou sob pressão familiar era namoro, noivado e casamento, e nele depositavam a esperança de felicidade eterna. Até quando essa ideia irá prevalecer?
- Penso que a tendência é não mais se casar esperando que seja para a vida toda. Cada vez menos pessoas esperam isso. O importante é as pessoas saberem que um casamento pode ser ótimo, mas para isso é necessário reformular as expectativas alimentadas a respeito da vida a dois. Mas o principal a ser reformulado é a ideia equivocada de que quem ama não sente desejo de fazer sexo com mais ninguém. Essa crença gera muito sofrimento desnecessário.

- A ciência acredita que a monogamia não é natural para o ser humano. Porém, em sua maioria, quando há uma parte traída em uma relação, o sentimento que prevalece é o de frustração. Esse sentimento despertado após descobrirmos uma “pulada de cerca” tem raízes culturais ou fisiológicas?
- Culturais, claro. A nossa cultura nos condiciona a acreditar que quem ama não se interessa por mais ninguém. A frustração ao descobrir que o parceiro ou a companheira se interessou por outra pessoa vem daí. A própria palavra “traição”, que considero inadequada para se referir a relações extraconjugais, já vem carregada de uma crítica negativa. Trair é algo sério. Está na hora de as pessoas perceberem que fidelidade não tem nada a ver com sexualidade.

- Em uma relação, é rotineiro que uma das partes tente controlar o parceiro...

- As pessoas tentam controlar o outro porque o adulto aprendeu a viver o amor de um modo que é, em quase todos os aspectos, semelhante à forma da relação amorosa vivida com a mãe pela criança pequena. Por se sentir constantemente ameaçada de perder esse amor - sem o qual ela perde o referencial na vida e também fica vulnerável à morte física -, a criança se mostra controladora, possessiva e ciumenta, desejando a mãe só para si. Quando surge uma relação amorosa, os adultos passam de uma dependência para outra. Assim, é por intermédio da pessoa amada que se tenta satisfazer as necessidades infantis. Reeditando a mesma forma primária de vínculo com a mãe, o antigo medo infantil de ser abandonado reaparece e a pessoa amada se torna imprescindível. Não se pode correr o risco de perdê-la. O controle, a possessividade e o ciúme passam, então, a fazer parte da relação.



- E o amor virtual, com o qual a sociedade flerta há alguns anos, tende a se estabelecer em caráter definitivo?



- Penso que sim. E é provável que até se aperfeiçoe. Muitos se espantam quando alguém diz que se relaciona pela internet. Acreditam tratar-se apenas de fantasias solitárias de pessoas carentes. “Como é possível amar uma pessoa sem poder vê-la, tocá-la, sentir seu cheiro?”, perguntam. Penso, entretanto, que essa estranheza ocorre porque qualquer forma de pensar e viver diferente da que estamos habituados gera insegurança e medo. Afinal, o novo assusta. Ainda mais no que diz respeito aos relacionamentos amorosos.

- Quais são as diferenças entre o amor virtual e o real?
- Na verdade, não é possível julgar negativamente os relacionamentos virtuais em favor dos reais, porque nos dois casos estamos diante de processos culturais e sociais de construção de uma experiência que nunca é natural. Observando a história, percebemos que os comportamentos amorosos humanos são extremamente variados, sendo impossível encontrar uma forma universal de amor.

- Ainda assim, ao se falar sobre sexo, ainda sobram constrangimentos e repressão. Por que, após tantos anos de discussão, o tema ainda é um tabu?

- Ainda é tabu, sim. Você já reparou que todo xingamento tem conotação sexual? Crianças aprendem a associar sexo a algo sujo e perigoso. Durante muitos séculos, o sexo foi considerado abominável. Afinal, controlar o prazer das pessoas é controlar as pessoas. Encontramos ainda muita gente com inibições, censuras e tabus. As pessoas sofrem com seus desejos, suas fantasias, suas culpas, seus medos, sua vergonha... Quantos desejos são reprimidos por fugirem do padrão estabelecido? Mas as mentalidades estão mudando. Desde a pílula, o sexo se dissociou da procriação e se aliou ao prazer. E as pessoas passaram a desenvolver cada vez mais o prazer sexual.

Fonte: http://clipping.vrc.puc-rio.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=24200&sid=87

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